A comunidade Baixa Verde fica localizada a 28 quilômetros do município Saboeiro e 463 quilômetros da capital do estado, Fortaleza. A região está vivenciando umas das piores secas dos últimos 30 anos, pois esse ano de 2012 choveu penas 144 milímetros e que o normal seria entre 400 milímetros e 500 milímetros.
Segundo o senhor Raimundo Albanir, agricultor, 66 anos quando ele chegou à região, há aproximadamente 40 anos, a situação era bem diferente. O local por ser parcialmente nativo, até que era muito bonito, porém faltava experiência aos poucos moradores da região e as famílias que chegavam. Para eles não havia outro meio de manejo e preparo de solo para plantio sem cortar as plantas nativas e sem fazer a queima de toda aquela vegetação. E tudo isso acabava silenciosamente causando um grande impacto ambiental, deixando a terra acidentada e desprotegida. Inocentemente por falta de informação e capacitação não sabiam eles que além de estar fazendo tudo da maneira errada, estavam cada vez mais empobrecendo os nutrientes do solo de onde eles retiravam os seus próprios alimentos, caminhando então para o que chamamos de solo morto.
A produção se resumia apenas ao plantio do milho e do feijão. Esta realidade acabava limitando a renda e o desenvolvimento da comunidade, impedindo-os de uma vida saudável, tranqüila e sustentável. E isso se repetiu durante anos, nos quais as dificuldades só aumentavam e os recursos cada vez mais diminuíam, pois mal conseguiam produzir e colher para os seus próprios sustentos.
Foi quando em 2001 a Cáritas Diocesana de Iguatu iniciou um trabalho de conscientização agroecológica com as famílias agricultoras da comunidade. O projeto utilizado foi o de agrofloresta que é um modelo de produção agrícola adaptado a região, tendo o cuidado em manter a vegetação nativa, combinando-a com plantas frutíferas de cultivos temporários e de ciclo anual. O processo de plantio inicia com os agricultores fazendo o roço e no local, deixam tudo o que foi roçado e podado das arvores no próprio solo, para que se transformem em adubo natural e mantenham a terra mais protegida do calor intenso do semiárido.
Desde o inicio o projeto foi desenvolvido em mutirão, pois com o trabalho coletivo a produção seria maior e alcançaria melhores resultados. Coletivamente começaram então os plantios de palma forrageira que necessita de pouca água e serve para alimento de pequenos animais. alem disso, plantou-se a macaxeira, umbu, sorgo, feijão e cajarana. As espécies da região que iam nascendo também eram preservadas, como o angico, aroeira, maniçoba, canafistula, juazeiro e outras.
No decorrer da implantação da agrofloresta algumas dificuldades foram surgindo, o fato do roçado não ser bem cercado, facilitava a entrada dos animais na plantação e a água na propriedade durava muito pouco, pois não era bem aproveitada. Foi assim então que para superar essas primeiras dificuldades o projeto forneceu para a comunidade uma maquina manual de fazer telas de arame e o arame necessário para a produção, com o qual os agricultores conseguiram cercar toda a área da agrofloresta. Em relação à água que não era bem aproveitada e durava pouco foram construídas duas pequenas barragens de pedra e cal, um cacimbão e uma barragem subterrânea com a finalidade de aumentar a capacidade de armazenamento de água e manter o solo mais úmido, mantendo viva a plantação.
A transformação da comunidade já é visível e outros benefícios já foram conquistados. Além do projeto da agrofloresta, a comunidade tambémfoi beneficiada pelos Programas Um Milhão de Cisternas (P1MC) e Uma Terra e Duas Águas (P1+2) da Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA).
O sucesso da agrofloresta é inevitável e vem refletindo alterações significativas no que se refere ao equilíbrio sustentável do ambiente e a qualidade de vida das famílias. O trabalho coletivo serve também para que as famílias fortaleçam ainda mais o vínculo umas com as outras e percebam que unidas elas podem chegar mais longe. Seu Raimundo adiciona também que aprendeu uma nova maneira de preservar a terra e a natureza e percebeu que tudo precisa estar em harmonia. “Precisamos respeitar os animais e os seus espaços, pois eles chegaram primeiro que nós. Eu respeito do grande ao pequeno”, diz seu Raimundo.
De acordo com seu Francisco Elvideu Pascoal, agricultor, 72 anos, também morador da comunidade, outro investimento foi a criação de pequenos animais como ovinos, caprinos, porcos e galinhas. Até as rações para os animais são produzidas na própria comunidade e como segunda alternativa para alimentação dos animais além da pastagem nativa eles também utilizam a palma, a leucena, o sorgo e o milho.
A diversificação de fruteiras da comunidade também é vasta. Pode-se notar seriguela, manga, banana, goiaba, mamão entre outros. A maneira utilizada para irrigação principalmente das mudas das fruteiras é por meio de gotejamento.
Mesmo com esta estiagem longa a comunidade de Baixa Verde não sentiu a passagem da seca. Notaram realmente que este ano que se passa o calor está muito intenso e a vegetação sofre mais que nos anos anteriores. A reserva de água também não está nas proporções que eles esperavam. mas graças as inúmeras capacitações recebidas, aos intercâmbios que participaram e a capacidade de organização e produção que a comunidade implantou, as famílias conseguiram se manter preparadas para uma situação alarmante como a que o semiárido está vivendo nos últimos meses. Fica evidente o poder de um projeto simples como esse e o técnico agrícola Oneci ainda complementa que a comunidade hoje é vista como exemplo de superação para muitos órgãos e muitas outras comunidades até mesmo em outros estados, pois o trabalho foi iniciado em áreas degradadas, mal cuidadas e desprotegidas e se deu certo em uma comunidade como essa, imagine em comunidades com melhores condições.
Seu Raimundo afirma que o projeto criou uma nova maneira de pensar e de agir. Eles não imaginavam a importância das riquezas naturais que eles tinham e aprenderam muito sobre a preservação.
“considero isso aqui uma área sagrada, convivo com todos os animais em harmonia, pois todo ser vivo precisa viver”, diz Seu Raimundo.
Encerrando então nossa visita a comunidade, não resisti e perguntei ao seu Raimundo:
Porque vocês não colhem esses lindos mamões que já estão maduros?
E seu Raimundo com um belo sorriso no rosto respondeu:
Não podemos esquecer os pássaros não é? Eles também precisam se alimentar.
“uma das coisas mais fortes aqui é a questão da própria vida natural, aqui tudo é respeitado desde a formiga até o animal mais peçonhento, é dessa mesma forma que eles estão respeitando o ambiente, a natureza os presenteiam com toda essa fartura”. Oneci Angelim.